segunda-feira, junho 25, 2007

Do que não se sabe

Quem te disse ao ouvido esse segredo
Que raras deusas têm escutado
Aquele amor cheio de crença e medo
Que é verdadeiro só se é segredado?...
Quem to disse tão cedo?

Não fui eu, que te não ousei dizê-lo.
Não foi um outro, porque o não sabia.
Mas quem roçou da testa o teu cabelo
E te disse ao ouvido o que sentia?
Seria alguém, seria?

Ou foi só o que sonhaste e eu te o sonhei?
Foi só qualquer ciúme meu de ti
Que o dito, porque o não direi,
Que o supôs feito, porque o só fingi
Em sonhos que nem sei?

Seja o que for, quem foi que levemente,
Ao teu ouvido vagamente atento,
Te falou desse amor em mim presente
Mas que não passa do meu pensamento
Que anseia e que não sente?

Foi um desejo que, sem corpo ou boca.
A teus ouvidos de eu sonhar-te disse
A frase eterna, imerecida e louca
A que as deusas esperam da ledice
com que o Olimpo se apouca.


Fernando Pessoa in "Intervalo"
Imagem de Kunstfotografie "Secouer la cerise"


Canela

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